quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Da indústria da seca à indústria da pobreza

Reinaldo Azevedo

Olhem, talvez seja mesmo uma dificuldade e tanto tabular os dados coletados pelo IBGE. Mas, por mais que haja aí questões técnicas as mais complexas, os números são de quase seis anos passados. Terão ainda alguma validade? Olhem que curioso. Eu torço, sinceramente, para que estejam defasados — e, nesse caso, seriam de pouca valia. Ou, então, eles são, seis anos de Bolsa Família depois, ainda atuais. E isso seria evidência de um grande desacerto.

Vejam só. Lula é, como se sabe, bem-avaliado no Brasil inteiro. Mas quem lhe garante a popularidade na casa dos 80%, com a quase unanimidade, é o Nordeste, justamente onde o Bolsa Família é mais presente em razão dos dados que estão no CD. Parece que, então, duas coisas se misturam para produzir esse resultado espetacular: a miséria e o linimento do Bolsa Família. Terá o programa, seis anos depois, mudado as condições estruturais que permitiram coletar números tão desalentadores? Acho que não. Temo que o tal mapa, mesmo com mais de meia década de atraso, continue atual.

E, se assim for, a região assiste apenas à versão moderna da indústria da seca, com o coronelismo federalizado — sem prejuízo, como já se noticiou à farta, dos coronelismos locais. Espero que não se demore mais seis anos para sabermos se o Bolsa Família foi, então, eficiente para corrigir algumas deficiências coletadas em… 2002 e 2003. Ou se, como parece, o programa substituiu a índústria da seca pela indústria da pobreza.

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

MPF/RS denuncia mulheres que fraudaram o bolsa-família em Taquaruçu do Sul

Aumento de renda deveria provocar a exclusão delas no programa, o que não ocorreu

O Ministério Público Federal em Carazinho (RS) ofereceu à Justiça Federal denúncia contra seis beneficiárias do bolsa-família, no município de Taquaruçu do Sul, pela prática de estelionato contra a União. Duas delas eram aposentadas que omitiram esse fato ao se cadastrarem no programa. As demais são agricultoras que obtiveram aumento da renda per capita e não comunicaram o fato ao município. Esse aumento de renda deveria provocar a exclusão delas no programa, o que só não ocorreu porque elas omitiram esse fato, para continuarem recebendo o bolsa-família.

A autora da denúncia, procuradora da República no município de Carazinho Patrícia Muxfeldt explica que "os recursos do Programa Bolsa Família destinam-se às unidades familiares que se encontram em situação de extrema pobreza ou pobreza". Inicialmente, a Medida Provisória 132/2003 considerava as pessoas cuja renda per capita não ultrapassasse o valor de 50 reais para o caso de extrema pobreza e cem reais, para os considerados pobres. Hoje, a Lei n° 10.836/2004 considera os limites de 60 reais (extrema pobreza) e 120 reais (pobreza), por pessoa da família.

As investigações mostraram, enfatiza a procuradora da República que, entre os anos de 2004 e 2005, a renda das agricultoras denunciadas teve um acréscimo superior a 50% em relação aos seus rendimentos do ano anterior. "Esse aumento expressivo das suas rendas familiares demonstra a plena consciência da ilicitude do ato que praticaram, o qual visou fraudar o Programa Bolsa-família", destaca ela.

A procuradora Patrícia Muxfeldt entende que essas pessoas podem ser enquadradas por crime de estelionato, art. 171, do Código Penal, que prevê de um a cinco anos de reclusaão mais multa, podendo, em seu parágrafo 3º, ter a pena aumentada em um terço pelo fato de ter sido cometido em detrimento de entidade de assistência social. (28/11/2008)


Assessoria de Comunicação Social
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quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Bolsa-voto.

Da Folha:

Principal programa social do país, o Bolsa Família tem sido utilizado nesta campanha municipal como uma nova modalidade de cabresto eleitoral.Candidatos a prefeito e a vereador usam o programa federal de transferência de renda (cuja base de dados para a seleção dos beneficiários é controlada pelos municípios) tanto para agradar ao eleitor, oferecendo-lhe um cartão de beneficiário em troca do voto, como para ameaçá-lo, condicionando sua permanência no programa à vitória de um dado político.Neste ano, o governo reajustou em 8% o valor do benefício, anunciou um programa de qualificação de profissionais específico aos beneficiários e estendeu o benefício a jovens de 16 e 17 anos -iniciativas tidas como eleitoreiras pela oposição.À época do reajuste, o TSE disse que a medida poderia ser contestada no tribunal, mas até hoje ela não o foi. Ao contrário, a oposição também exalta o programa na campanha.As eleições deste ano são, na prática, a primeira grande experiência municipal do uso do Bolsa Família para arregimentar votos. Em 2004, o programa ainda tomava corpo, beneficiando 4,5 milhões de famílias. Hoje são 10,8 milhões de famílias contempladas, que recebem entre R$ 20 e R$ 182.Nas últimas três semanas, a Folha encontrou casos de uso eleitoral do programa no interior de Ceará e Piauí e ouviu denúncias informais em Paraíba, Bahia e Rio Grande do Norte.Promotores dizem que o principal obstáculo à fiscalização é o medo dos eleitores de serem perseguidos após a denúncia.Em Pedro Laurentino (PI), o candidato à reeleição, Gilson Rodrigues (PTB), encaixou no programa famílias de cidades vizinhas. Em troca, a condição que transferissem títulos eleitorais para Pedro Laurentino."Antes da eleição [de 2004, quando Rodrigues foi eleito] chegaram pra mim e falaram: "Transfere o título pra lá [Pedro Laurentino] e a gente dá um jeito de colocar você no cadastro'", disse Luciene Rodrigues, 28, que vive com o filho Walison, 7, em Socorro do Piauí.Outro morador do município que recebe o Bolsa Família pela cota de Pedro Laurentino é Luiz Gonzaga Pires, 50. "[Em 2004] transferi o título e lá, depois, o prefeito [Rodrigues] ajeitou um Bolsa aí pra gente."O prefeito e candidato à reeleição alega um "problema de regularização fundiária". Segundo ele, há cerca de 300 famílias que, por viverem próximas à divisa com outros municípios, votam e recebem o Bolsa Família em Pedro Laurentino, mas são contados pelo IBGE como habitantes de outras cidades. A Folha, porém, encontrou famílias com essa particularidade não apenas nos limites dos municípios: algumas delas vivem num bairro pobre no centro de São João do Piauí, a 50 km de Pedro Laurentino.Outro uso do Bolsa Família na eleição ocorreu em Acopiara (CE). Enquanto respondia a uma pesquisa encomendada pela campanha do prefeito, Antonio Almeida (PTB), Maria Aparecida Pereira, 51, foi surpreendida com uma pergunta sobre o Bolsa Família. A Folha teve acesso ao questionário."A senhora ou alguém que mora na sua casa recebe o Bolsa Família?", quis saber o pesquisador. "Sim, eu recebo", respondeu Maria Aparecida. Na seqüência, duas perguntas sobre eleição. Em quem votará para vereador e para prefeito."Quando eu disse que votaria no Vilmar [adversário do prefeito], ele perguntou se eu não tinha medo de perder o benefício", diz a dona-de-casa, que completa: "Fiquei com muito medo de perder".Mãe de seis filhos, ela saiu gritando pela rua, e o caso foi parar na Promotoria eleitoral, que abriu investigação. O prefeito nega a prática e diz que a denúncia é uma tentativa do adversário para prejudicá-lo.Em Aroeiras do Itaim (PI), um lavrador procurou o Ministério Público para denunciar a responsável da prefeitura pelo Cadastro Único, licenciada do cargo para concorrer à vereadora, de tirar-lhe o benefício se não votasse nela. "Do jeito que eu dou o cartão [do Bolsa Família], eu também retiro", disse a candidata, segundo relato do lavrador aos promotores.

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Bolsa Família sustenta novo voto de cabresto no Nordeste

Por Eduardo Scolese, na Folha:

Principal programa social do país, o Bolsa Família tem sido utilizado nesta campanha municipal como uma nova modalidade de cabresto eleitoral.
Candidatos a prefeito e a vereador usam o programa federal de transferência de renda (cuja base de dados para a seleção dos beneficiários é controlada pelos municípios) tanto para agradar ao eleitor, oferecendo-lhe um cartão de beneficiário em troca do voto, como para ameaçá-lo, condicionando sua permanência no programa à vitória de um dado político.
Neste ano, o governo reajustou em 8% o valor do benefício, anunciou um programa de qualificação de profissionais específico aos beneficiários e estendeu o benefício a jovens de 16 e 17 anos -iniciativas tidas como eleitoreiras pela oposição.
À época do reajuste, o TSE disse que a medida poderia ser contestada no tribunal, mas até hoje ela não o foi. Ao contrário, a oposição também exalta o programa na campanha.
As eleições deste ano são, na prática, a primeira grande experiência municipal do uso do Bolsa Família para arregimentar votos. Em 2004, o programa ainda tomava corpo, beneficiando 4,5 milhões de famílias. Hoje são 10,8 milhões de famílias contempladas, que recebem entre R$ 20 e R$ 182.
Nas últimas três semanas, a Folha encontrou casos de uso eleitoral do programa no interior de Ceará e Piauí e ouviu denúncias informais em Paraíba, Bahia e Rio Grande do Norte.
Promotores dizem que o principal obstáculo à fiscalização é o medo dos eleitores de serem perseguidos após a denúncia.
Em Pedro Laurentino (PI), o candidato à reeleição, Gilson Rodrigues (PTB), encaixou no programa famílias de cidades vizinhas. Em troca, a condição que transferissem títulos eleitorais para Pedro Laurentino.

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quarta-feira, 23 de julho de 2008

Governo não sabe se 1 milhão de crianças estão na escola

Por Lisandra Paraguassú, no Estadão:

O governo federal não sabe onde estão quase 7% das crianças de 6 a 15 anos do programa Bolsa-Família. São mais de um milhão de estudantes que deveriam ter a freqüência escolar acompanhada pelas prefeituras e Ministério da Educação (MEC), mas não constam como matriculados em nenhuma escola do município onde moram.
A freqüência escolar é uma das contrapartidas que as famílias beneficiárias do programa precisam cumprir para garantir o pagamento mensal. Para isso, as prefeituras conferem com as escolas a presença das crianças matriculadas no ensino fundamental e repassam para o ministério. Se por três bimestres seguidos as crianças não forem a pelo menos 85% das aulas, a família tem o pagamento bloqueado.
No entanto, no caso dessas 1,04 milhão de crianças, as prefeituras não conseguem achá-las. “Não sabemos se essas crianças estão ou não na escola. O mais provável é que seja apenas um problema de cadastro. Não acreditamos que todas elas estejam fora da escola”, afirma Daniel Ximenes, diretor de Estudos e Acompanhamento das Vulnerabilidades Educacionais da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do MEC. Os números já foram piores. No primeiro ano do controle efetivo de freqüência, 19% das crianças não eram encontradas.
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quinta-feira, 10 de julho de 2008

Veja No Que Deu o Fome Zero de Lula



ricardosalles

Repasse Urgente Antes das Eleições. Lula afinal conseguiu acabar com a FOME... no Planalto.

terça-feira, 8 de julho de 2008

“Garapa?” - Um artigo de Ali Kamel

O cineasta José Padilha, diretor dos premiados “Tropa de elite” e “Ônibus 174”, está terminando de rodar “Garapa”, um documentário que mostra o dia-a-dia de três famílias famintas do interior do Ceará. Em relação ao filme, ele disse à Folha de S. Paulo: “É eticamente inadmissível que alguém, no grupo dos beneficiados históricos deste país, olhe para os miseráveis que não têm o que comer e diga que os R$ 58 que o governo dá a eles são uma política errada”. Mais adiante, acrescentou que o valor do benefício era insuficiente para matar a fome daquelas famílias.

Ele está absolutamente certo ao fazer as duas afirmações.

Mas absolutamente errado ao acreditar que o Bolsa Família, tal como está posto, seja a solução do problema. A enorme abrangência do programa pode ser contraproducente.

Citando uma pesquisa sobre segurança alimentar, feita pelo Ibase entre os beneficiários do Bolsa Família, divulgada há pouco, Padilha disse que 11,5 milhões de brasileiros estão na mesma situação daquela em que vivem as três famílias de “Garapa”. Esse tipo de pesquisa, porém, ao contrário do que o nome sugere, não é capaz de comprovar se a fome existe de fato na população pesquisada. Com perguntas que comportam apenas um “sim” ou “não”, a pesquisa apenas registra o que informam os entrevistados sobre a própria segurança alimentar. Há uma ou duas perguntas bem objetivas, como esta: “Nos últimos três meses, os alimentos acabaram antes que os moradores tivessem dinheiro para comprar mais comida?” Mas, na maior parte, as perguntas medem mais expectativas, temores, frustrações. Dou um exemplo: “Nos últimos três meses, os moradores deste domicílio tiveram a preocupação de que os alimentos acabassem antes de poderem comprar ou receber mais comida?” Outra pergunta: “Nos últimos três meses, os moradores deste domicílio ficaram sem dinheiro para ter uma alimentação saudável e variada?”

Com perguntas assim, a pesquisa concluiu que 21% dos beneficiários (11,5 milhões de pessoas), têm insegurança alimentar grave (fome), 34%, moderada (restrição na quantidade de alimentos) e 28%, leve (não há falta de alimentos, mas o temor de que venha a faltar). Feita exclusivamente entre os beneficiários do Bolsa Família, a pesquisa pode gerar uma distorção: conhecendo os objetivos do programa, talvez os beneficiários respondam de modo a continuar a merecer o benefício. Não considero esse ponto decisivo, porém. Pesquisas de segurança alimentar são feitas de tal modo que, mesmo quando feitas na população geral, o índice dos que se declaram em situação de insegurança alimentar é sempre alto. Aqui e no mundo.

A pesquisa brasileira é inspirada numa metodologia aplicada anualmente nos EUA desde 1995. Lá, o governo federal gastou no ano passado US$ 53,3 bi com programas de distribuição de comida aos mais pobres, sendo US$ 33,2 bi com o Food Stamps, um programa que distribui cartões magnéticos a quem esteja abaixo da linha de pobreza, utilizados para adquirir apenas comida em lojas credenciadas (no Bolsa Família, o beneficiário pode comprar o que quiser). São 26,5 milhões de beneficiários, que recebem, em média, US$ 214 por família. Mesmo assim, em 2006, os números da pesquisa americana foram desconcertantes: lá existem 35,5 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar, sendo que 11,1 milhões em insegurança alimentar grave (em termos absolutos, o mesmo resultado encontrado aqui). Já disse antes, e repito: se nem na nação mais próspera do planeta, com os seus programas assistenciais multimilionários, a insegurança alimentar foi resolvida, o problema não é do país, mas do conceito de insegurança alimentar.

O único método viável de comprovar a existência de fome em grandes grupos populacionais é pesando e medindo as pessoas. Porque, se a ingestão de calorias for menor do que a necessária, o indivíduo emagrecerá: a relação peso/altura mostrará esse emagrecimento, e, se ele for superior a certos limites, a fome estará comprovada. Para adultos, a OMS considera aceitável um índice de até 5% de emagrecidos, porque, estatisticamente, esta é a proporção de indivíduos magros por natureza em qualquer grupo. A Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), do IBGE, realizada entre 2002 e 2003 (antes, portanto, do Bolsa Família) mediu e pesou os brasileiros e encontrou um índice de magros de 4%, dentro da normalidade abaixo do permitido, portanto (no Haiti, o índice foi de 19%, na Etiópia, de 38% e, na Índia, de 49%).

No Brasil, em alguns poucos estratos populacionais, o índice foi levemente superior a 5%: sempre mulheres, de uma maneira geral da zona rural (o pico foi o Nordeste, com 7,2%) das faixas de renda mais baixas (o pico foi a faixa de 1/4 de salário mínimo, com 8,5%). Assim, nesses dois casos extremos, podia-se falar em fome em 2,2% das mulheres da zona rural do Nordeste e em 3,5% das mulheres na faixa de renda mais baixa. Os dados da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher (PNDS), realizada em 2006 e divulgada na última quinta-feira, mostram, porém, que essa situação já foi superada. No Brasil, o índice de mulheres emagrecidas foi de 3,5% e em nenhuma região alcançou 5%. O índice só ultrapassou ligeiramente os 5% entre as mulheres sem escolaridade (5,3%) e com mais de seis filhos (6%).

Mesmo entre as crianças, a notícia é excelente. A desnutrição aguda é também medida pela relação peso/altura, mas, para elas, o índice aceitável é de até 3%, o que corresponderia a crianças geneticamente magras. O índice encontrado pela PNDS foi de apenas 1,6%, ou seja: é virtualmente nula a fome em crianças no Brasil. A desnutrição crônica é medida pela relação altura/idade, que, segundo a pesquisa, “expressa o crescimento linear da criança e, nesta medida, sintetiza a história do seu estado nutricional, do nascimento (ou mesmo antes) até o momento atual, refletindo o aporte de energia, de macronutrientes e de vitaminas e minerais.” Em outras palavras, é uma relação que traz mais as marcas do passado. O índice aceitável é de até 3%, o que corresponde à proporção de crianças geneticamente pequenas. No Brasil, o índice despencou de 13,4%, em 1996, para 6,8% em 2006, menos da metade do índice do México (15,5%) e menor do que o da Argentina (8,2%). Ainda há fome no Brasil? Sim, o que é uma tragédia, mas uma tragédia na casa das centenas de milhares, nunca na casa dos milhões.

O filme de Padilha chama-se “Garapa” porque este é o nome da mistura de água e açúcar que as famílias como a que ele retratou dão a seus filhos quando não há alimentos. Uma pesadelo. Mas que não tem as dimensões que ele acredita. A POF não detectou em nenhum estrato da população (nem mesmo nos de baixíssima renda) dietas à base de garapa.

Por que a abrangência do Bolsa Família pode estar sendo contraproducente? Porque o programa distribui um dinheiro pequeno a 46 milhões de pessoas, na suposição de que todas passam fome. Se o programa fosse mais bem dimensionado, o dinheiro dado aos que, de fato, não tem comida poderia ser substancialmente maior a um custo total substancialmente menor. Em vez de R$ 10,8 bi, o Bolsa Família poderia gastar, sei lá, 20% disso, dando muito mais a quem precisa e investindo o restante em educação, único instrumento que tira de fato o pobre da pobreza.

Se em seu novo filme, Padilha usar três famílias que passam fome como exemplo de 11 milhões, terá sido induzido a erro pela leitura equivocada de uma pesquisa. Se não fizer as ressalvas, o filme não será a sua volta ao documentário, mas a sua permanência na ficção.

(*) Artigo publicado originalmente em O Globo Online, no dia 7 de julho de 2008

A política da fome e a fome de política

Reinaldo Azevedo

A fome, como vocês sabem, rende pano pra manga e voto pra urna. Em breve, Lula decretará a sua extinção — como nunca antes nestepaiz… Obra do Babalorixá de Banânia! Estaremos, então, diante de uma formidável impostura. O presidente declarará extinta a fome que já não existia havia tempos. Até por isso, o problema está longe de ser simples.

E, se é complexo e requer clareza, uma boa pedida é ler o que escreve Ali Kamel — sobre este assunto em particular e muitos outros também. Abaixo, segue um trecho de um artigo seu chamado “Garapa?”, publicado no Globo On Line. No pé do post, o link para a íntegra.
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O cineasta José Padilha, diretor dos premiados “Tropa de elite” e “Ônibus 174”, está terminando de rodar “Garapa”, um documentário que mostra o dia-a-dia de três famílias famintas do interior do Ceará. Em relação ao filme, ele disse à Folha de S. Paulo: “É eticamente inadmissível que alguém, no grupo dos beneficiados históricos deste país, olhe para os miseráveis que não têm o que comer e diga que os R$ 58 que o governo dá a eles são uma política errada”. Mais adiante, acrescentou que o valor do benefício era insuficiente para matar a fome daquelas famílias.

Ele está absolutamente certo ao fazer as duas afirmações.

Mas absolutamente errado ao acreditar que o Bolsa Família, tal como está posto, seja a solução do problema. A enorme abrangência do programa pode ser contraproducente.

Citando uma pesquisa sobre segurança alimentar, feita pelo Ibase entre os beneficiários do Bolsa Família, divulgada há pouco, Padilha disse que 11,5 milhões de brasileiros estão na mesma situação daquela em que vivem as três famílias de “Garapa”. Esse tipo de pesquisa, porém, ao contrário do que o nome sugere, não é capaz de comprovar se a fome existe de fato na população pesquisada. Com perguntas que comportam apenas um “sim” ou “não”, a pesquisa apenas registra o que informam os entrevistados sobre a própria segurança alimentar. Há uma ou duas perguntas bem objetivas, como esta: “Nos últimos três meses, os alimentos acabaram antes que os moradores tivessem dinheiro para comprar mais comida?” Mas, na maior parte, as perguntas medem mais expectativas, temores, frustrações. Dou um exemplo: “Nos últimos três meses, os moradores deste domicílio tiveram a preocupação de que os alimentos acabassem antes de poderem comprar ou receber mais comida?” Outra pergunta: “Nos últimos três meses, os moradores deste domicílio ficaram sem dinheiro para ter uma alimentação saudável e variada?”

Com perguntas assim, a pesquisa concluiu que 21% dos beneficiários (11,5 milhões de pessoas), têm insegurança alimentar grave (fome), 34%, moderada (restrição na quantidade de alimentos) e 28%, leve (não há falta de alimentos, mas o temor de que venha a faltar). Feita exclusivamente entre os beneficiários do Bolsa Família, a pesquisa pode gerar uma distorção: conhecendo os objetivos do programa, talvez os beneficiários respondam de modo a continuar a merecer o benefício. Não considero esse ponto decisivo, porém. Pesquisas de segurança alimentar são feitas de tal modo que, mesmo quando feitas na população geral, o índice dos que se declaram em situação de insegurança alimentar é sempre alto. Aqui e no mundo.

Para ler a íntegra do artigo, clique aqui

sábado, 28 de junho de 2008

Bolsa Família aplaca a fome, mas não acaba com a miséria

Por Antônio Gois, na Folha:

Os beneficiários do Bolsa Família afirmam que o programa os ajuda a consumir mais alimentos -especialmente açúcares- e não causou, na opinião dos favorecidos, o “efeito-preguiça”, ou seja, o acomodamento do trabalhador por causa da renda garantida. Mas faltam programas que ajudem a superar a pobreza e diminuir a dependência dos recursos.
É o que mostra uma pesquisa coordenada pelo Ibase (Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas) e feita pelo instituto Vox Populi com 5.000 beneficiários do Bolsa Família.
Nesta semana, o governo do presidente Lula anunciou um reajuste médio de 8% nos benefícios do Bolsa Família, o principal programa social da gestão petista. O valor médio pago pelo programa passa dos atuais R$ 78,70 para R$ 85.
Com financiamento da Finep (órgão de apoio à pesquisa do Ministério da Ciência e Tecnologia), o objetivo principal do levantamento foi investigar o nível de segurança alimentar e nutricional dos favorecidos.
Os itens onde eles disseram mais gastar o dinheiro do Bolsa Família foram alimentação, material escolar e vestuário.
No quesito alimentação, o principal aumento foi no consumo de açúcares: 78% dos titulares disseram ter aumentado a compra de açúcar, sorvetes, gelatinas, bombons ou refrigerantes. Em seguida aparecem arroz, cereais e leite.
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quinta-feira, 26 de junho de 2008

RUTH CARDOSO 1 - Como não sou político, jamais deixo de lado a política

Reinaldo Azevedo

Em dois dos posts que escrevi sobre a morte da professora e antropóloga Ruth Cardoso, mulher do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, lembrei, claro, do dossiê que foi tramado contra ela e o marido na Casa Civil, cuja titular é Dilma Rousseff. Alguns petralhas reclamaram indignados: “Nem numa hora como essa você deixa de falar sobre política, seu…” Não! Eu não sou e não serei político. Por isso jamais deixo a política de lado. Entenderam?

Os profissionais da área podem fazê-lo. Eu não. Lula é um que vive acusando os outros de “fazer política”. O homem determinou o reajuste dos valores do Bolsa Família. E ai de quem reagir, sugerindo que ele deveria fazê-lo depois das eleições de outubro. Ele diria que a pessoa está… “fazendo política”. O Babalorixa só pensa no bem das pessoas, ora essa. Esta estupidez perigosa — negar a política fazendo política — está na moda. Querem um exemplo? Barack Obama nos EUA. Parte de seu charme, para quem o acha charmoso, deriva de ele parecer um não-político acusando os adversários de… mesquinharias políticas.

Mas volto ao ponto. Sim, eu lembrei, sim, a obra do ministério de Dilma Rousseff, que teve o mau gosto de comparecer ao velório. E lembrarei outras vezes. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso conserva um papel institucional mesmo fora do poder. Ademais, é um homem civilizado. E não lhe cabia outro papel que não receber as condolências de Lula e seus ministros. É o que lhe recomendaria a sua parceira, mulher e amiga de mais de 56 anos. Na verdade, ele e Ruth se conheceram em 1948.

A morte de Ruth Cardoso nos surpreendeu a todos e, por algum tempo ao menos, parece ter tirado o país de uma espécie de transe. E nos demos conta, de súbito, de que chegava ao fim a trajetória de uma intelectual que, nos oito anos em que o marido foi presidente da República, comportou-se com uma elegância e discrição ímpares, sem, no entanto, deixar de fazer o seu trabalho: quem quer faça a genealogia honesta dos programas sociais em curso vai chegar às iniciativas de Ruth à frente do Comunidade Solidária. Mas uma lição da professora, no entanto, foi esquecida: ela tinha horror ao assistencialismo. Aliás, não custa anotar à margem: o governo FHC tinha uma espécie de vergonha de fazer propaganda de seus programas de transferência de renda. O lulismo, ao contrário, faz publicidade até da renda que não transfere.

Aos 77 anos, podendo viver uma vida confortável, dedicar-se apenas a seus livros, aos netos, às viagens que eventualmente fazia em companhia do marido em palestras mundo afora, Ruth, não obstante, trabalhava pra valer na ONG Comunitas, sucessora do Comunidade Solidária. E com recursos que buscava na iniciativa privada — aliás, era o que fazia também o Comunidade Solidária. A ONG de Ruth era mesmo “não-governamental”. Desde que se fez professora, no Brasil ou no exílio, jamais deixou de trabalhar. E a morte a encontrou, perto dos 80 anos… trabalhando! Não é espantoso? Ruth, sozinha, era um verdadeiro Partido dos Trabalhadores.

Sua frugalidade era notável e notória. Em tudo: dos gestos à vestimenta, do comportamento às palavras. Tinha uma incompatibilidade que parecia inata com o espetaculoso, o vulgar, o mundano. Media as palavras e ouvia educadamente o outro, sempre atenta ao sentido exato do que se dizia, cobrando precisão. Era, em suma, uma pessoa admirável.

Não é que certa estirpe hoje no poder ousou envolver o nome desta senhora exemplar numa tramóia para livrar o governo de revelar seus desatinos com os cofres públicos? A canalha comprometida com o dossiê sabe muito bem que o trabalho de plantação de notinhas em jornal sugerindo que FHC e Ruth viviam como nababos já havia começado. Sim, dossiê clandestino, mas forjado nos porões da Casa Civil. Quando as pegadas do comando já não podiam mais ser escondidas, então se inventou uma nova desculpa: aqueles gastos não eram mais sigilosos.

Não, eu não sou político. Também não preciso, felizmente, sustentar nos ombros o papel institucional de FHC. E por isso reitero: a senhora Dilma Rousseff deveria ter alegado uma indisposição qualquer. De fato, poderia ter ficado em Brasília, reunida com Franklin Martins e José Múcio — também presentes ao velório —, todos eles personagens com algum grau de participação no — como é mesmo, Dilma? — “banco de dados” criado na Casa Civil.

Que as Erínias se encarreguem dos covardes que praticaram a lambança. Eu só ajudo com a memória. O ex-presidente está institucionalmente obrigado a poupá-los. Eu não estou. Três meses antes de Ruth morrer — trabalhando, aos 77 anos —, eles tentaram assassinar a sua reputação. Uma trama palaciana. Onde há um chefe inequívoco.

Morta, Ruth sobreviveu. Mesmo vivos, espero que eles não sobrevivam.

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Presidente do TSE diz que reajuste do Bolsa Família pode ser contestado

Por Felipe Recondo, no Estadão Online

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Carlos Ayres Britto, adiantou nesta quarta-feira, 25, que o reajuste de 7% no valor pago a beneficiários do programa Bolsa-Família , em ano eleitoral, pode ser contestado na Corte. “Essa é uma questão sensível. Temos um encontro marcado com este fio de navalha”, afirmou. “Eu prefiro aguardar uma possível representação ao TSE para me pronunciar. Não vou me antecipar”, acrescentou.
Nas últimas semanas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de acordo com interlocutores, cobrou do ministro da Fazenda, Guido Mantega, a concordância com os gastos necessários para a concessão do reajuste. O ministro vinha resistindo à idéia, mas Lula o pressionou a tomar uma decisão logo, já que, a partir de 4 de julho, o aumento no valor de benefícios para a área social estará proibido pela legislação eleitoral. O reajuste anterior havia sido concedido em julho do ano passado e começou a ser pago no mês seguinte, quando o benefício foi elevado em 18,25%.
Pela lei 9504, de 1997, que estabelece normas para as eleições, o governo não pode, em ano eleitoral, distribuir benefícios, exceto nos casos de calamidade pública ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior. Foi com base nessa lei que o ex-presidente do TSE ministro Marco Aurélio Mello afirmou, no início do ano, ser inconstitucional a medida provisória editada pelo governo no final do ano passado para aumentar o número de beneficiários do programa Bolsa-Família.
“Não pode haver novidade no ano das eleições. O governo federal tem que ficar com as barbas de molho”, disse o ministro. “Tudo é muito sintomático. Por que às vésperas de eleições? Qual o objetivo? Não somos ingênuos de pensar que há apenas a preocupação no âmbito social”, acrescentou à época. A MP, porém, não foi questionada pela oposição. Por isso, o Supremo Tribunal Federal (STF) não analisou o assunto.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Bolsa Família acelera em regiões com mais eleitores

Por José Alberto Bombig, na Folha:

Grandes centros urbanos administrados por aliados do governo Lula foram os que registraram os melhores índices de incremento dos recursos recebidos do Bolsa Família desde a criação do programa de distribuição direta de dinheiro ao cidadão, no final de 2003.
É o que mostra levantamento feito pela Folha -com base nas transferências de verba do MDS (Ministério do Desenvolvimento Social)- para os 25 maiores colégios eleitorais do país. PMDB, PSB, PC do B, PDT e PP, além, é claro, do PT, integram a coalização governista hoje em Brasília.
O levantamento comparou o que as cidades recebiam de recursos quando o programa começou e quanto recebem agora. Em todas houve crescimento, mas em ritmo diferente. As cinco cidades que antes eram administradas pelos partidos de oposição frontal a Lula e passaram a ser geridas por políticos da base aliada registraram incremento de recursos -46% no total.
Municípios com prefeitos que estavam e seguiram apoiando o governo do presidente Lula também tiveram um salto no dinheiro recebido.
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terça-feira, 18 de março de 2008

Bolsa Família cresce e alcança 1,7 mi de potenciais eleitores

Por Eduardo Scolese, na Folha:

A menos de sete meses das eleições municipais, marcadas para outubro, o governo federal iniciou ontem o pagamento do Bolsa Família para jovens de 16 e 17 anos, num limite de dois por família. No Brasil, o voto é facultativo entre 16 e 18 anos.
Com a ampliação do benefício, o valor máximo mensal pago para uma família do principal programa social do governo petista passou de R$ 112 para R$ 172. Neste mês, dos 11 milhões de famílias que já recebem o Bolsa Família, 1,1 milhão terão seus benefícios ampliados com a nova modalidade -o limite era de 15 anos para o jovem receber o benefício.
O valor extra, de R$ 30 por adolescente nessa faixa etária e com pelo menos 75% de freqüência escolar, será creditado no cartão do responsável pela família que já é beneficiária do programa.
Com a inclusão dessa cota extra (de até R$ 60 por família), o volume mensal de recursos ao programa saltou de R$ 865,7 milhões para R$ 900,4 milhões (avanço de 4%), enquanto o valor médio do benefício subiu de R$ 75,38 para R$ 77,06 (crescimento de 2,2%).
Para receber o teto de R$ 172, a família deve ter renda per capita de até R$ 60, três filhos de até 15 anos e ao menos dois adolescentes de 16 e 17 anos. Ela receberá R$ 58 como benefício básico, R$ 18 por filho (num limite de três) e R$ 30 por adolescente (limite de dois).
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segunda-feira, 10 de março de 2008

Estado-dependentes 1 – A resposta cretina do governo

Por Lisandra Paraguassú, no Estadão:

Os dados que mostram um aumento do abandono escolar em municípios com alto atendimento do Bolsa-Família, como mostrou o Estado em reportagem publicada ontem , são vistos pelo governo com reserva. Tanto representantes do Ministério do Desenvolvimento Social quanto do Ministério da Educação (MEC) acreditam que o programa ainda é responsável por levar as crianças até a escola. A evasão, afirmam, acontece justamente quando o programa deixa de atendê-las, aos 15 anos.
“No programa há um claro efeito fixador na escola. Esse menino sai aos 15 anos, mas estaria saindo aos 10. O que precisamos agora é pensar uma política para atender depois dos 15 anos”, avalia a secretária de Educação Básica do Ministério da Educação, Maria do Pilar Almeida e Silva.
O problema, acredita o governo, ainda está na escola, na falta de estrutura do ensino, nos problemas enfrentados por professores e diretores. “O Bolsa-Família garante a entrada na escola. Mas a política de permanência não é exclusiva da escola. É aí que entram merenda escolar, uniforme, transporte”, diz a secretária.
Mais do que isso, admite a secretária, a idéia de “direito à educação” ainda é nova. “É um direito que não se discute, mas precisa ser absorvido pelas famílias”, diz, elogiando o trabalho do Ministério Público em Cupira (PE), também mostrado na reportagem do Estado.Pilarafirma que o mesmo está ocorrendo em outras cidades.
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Reinaldo Azevedo

Tremei! O governo está pensando. Diante do fato — não do chute — de que a evasão escolar cresce nas áreas atendidas pelo Bolsa Família, o governo diz uma coisa certa para defender um equívoco. Sim, sem o programa, talvez a criança saísse antes da escola. Assim, é melhor que fique até os 15 anos. Muito bem. Então o busílis é saber se estamos diante de um programa de transferência de renda sustentado. E não estamos. Isso está aprovado. Cessou o benefício por causa da idade, adeus escola!

Não sei o que Maria do Pilar quis dizer acima, mas suspeito: “Então por que não mais bolsa?” Sei lá, dos 15 aos 18. E depois? Bem, depois, o sujeito passa a ser um adulto com direito ao Bolsa Família. E assim vai. Isso faz fortuna eleitoral? Faz, sim. Tira alguém da pobreza absoluta, a mais extrema. Sim. Trata-se de um programa com alguma inclinação para gerar atividades que, por sua vez, gere renda? Não.

Mas ninguém mexerá no programa, pouco importa quem vença a eleição em 2010. O equívoco está consolidado.

Estado-dependentes 2 - Condenados ao bolsa-qualquer-coisa. Para sempre

Reinaldo Azevedo

A esquerda provoca com as tolices de sempre: “Ah, então por que o DEM e o PSDB não propõem o fim do Bolsa Família?…” Espertinhos os caras, não?

O Bolsa Família não vai acabar nunca, ora essa. Se o Brasil voltasse, um dia, a crescer 13% ao ano, como já aconteceu, haveria Bolsa ainda assim… Sabem cumé? O estado tem de cuidar dos seus pobres… Essa condenação é para sempre. Jamais vamos nos livrar disso. É discurso fácil.

Voltando à Faculdade de Direito da USP (ver posts abaixo), uma garota entre os 13 esquerdistas que estavam lá afirmou que a VEJA — ali no caso, eu — não se preocupava com os sem-teto e que a revista atacou o Ministério Público porque este defenderia o direito de ir e vir — e, segundo entendi, o direito de dormir na praça, coisa a que a revista e eu próprio estaríamos nos opondo…

Tudo mentira, é claro. Nem VEJA nem eu defendemos que um sem-teto seja levado a um albergue contra a sua vontade, mas VEJA e eu defendemos que espaço público é público. E isso quer dizer que não é moradia; que aquele bem tem de ser desfrutado por todos os cidadãos.

Eu não preciso que sem-teto more embaixo do viaduto, exposto a todos os riscos, para que eu possa ter uma causa. Os pobres não foram feiros para aliviar a consciência de ninguém, tampouco para compensar a falta de leitura.

Por que a lourinha humanista não se junta aos assistentes sociais da Prefeitura e vai lá tentar convencer o morador de rua a ir para o albergue? Talvez ela considere que, se o fizer, não estará combatendo o capitalismo, entendem? Então prefere gritar contra o suposto banco antimendigo.

Essa gente precisa da miséria para excitar a sua imaginação generosa.

domingo, 9 de março de 2008

Abandono escolar cresce entre dependentes do Bolsa-Família. E o voto em Lula também!!!

Por Lisandra Paraguassú, no Estadão. Volto depois:

O mais importante programa social do governo Lula, o Bolsa-Família, atende hoje quase um quarto da população do País (45,8 milhões), mas não está conseguindo cumprir um de seus principais objetivos: fazer com que as crianças completem ao menos os oito anos do ensino fundamental. Cruzamento de informações feito pelo Estado, com dados dos Ministérios do Desenvolvimento Social e da Educação, revela que nos 200 municípios onde há mais famílias dependentes do Bolsa-Família a evasão escolar, contando os abandonos da 1ª a 8ª séries, cresceu entre 2002 e 2005. Em alguns casos, o número de crianças que deixam a escola mais do que dobrou. Em todas as cidades mais da metade é atendida pelo programa.
O abandono escolar cresceu em 45,5% dos municípios (91) com mais atendimentos do Bolsa-Família. Em outros 18,5% (37 cidades) não houve piora ou melhora significativas - a variação foi de menos de 1 ponto porcentual para mais ou para menos. Juntos, a piora do abandono e a manutenção da péssima realidade escolar somam 64%. O ano de 2002 foi o último antes do início do Bolsa-Família, e 2005, o último com dados oficiais disponíveis.
Os 200 municípios expõem também um fenômeno político: uma melhora sensível no desempenho do candidato Luiz Inácio Lula da Silva entre os segundos turnos de 2002 e de 2006. Da eleição para a reeleição, o presidente aumentou os votos em todas as cidades com mais população atendida pelo Bolsa-Família, registrando, em alguns casos, votações fenomenais: os 3.408 votos de Araioses (MA), em 2002, por exemplo, viraram 12.958 votos na campanha da reeleição; os 2.996 votos de Girau do Ponciano (AL) subiram para 12.550 votos.
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Reinaldo Azevedo
O que é isso? Ora, o óbvio: o desastre do assistencialismo, que tanto seduz a esquerda de perfil petista, os intelectuais do miolo mole e até alguns que estariam mais identificados com teses liberais. O Brasil teve uma grande idéia para erradicar a pobreza: distribuir dinheiro. Dá certo? Ô se dá: enquanto se distribui o dinheiro. O garoto faz 15 anos, deixa de receber a graninha, a família faz o quê? Tira-o da escola e manda para o trabalho. Qual a surpresa?

Há dias, Ali Kamel escreveu um artigo no Globo em que chamou Bolsa Família de Bolsa-Eletrodoméstico. O dinheiro está indo para o consumo. Não se trata, digamos, de uma diminuição sustentada da pobreza. Parou de dar dinheiro, pimba! Volta tudo à estaca zero. De novo: é tão simples; é tão óbvio.

O subjornalismo que apóia o governo logo correu para demonizar o artigo. Claro, claro… Por alguma estranha razão que a canalha não consegue explicar, vai ver Kamel não gosta dos pobres. Só os anões, mascates e tocadores de tuba é que amam os deserdados. Toda estupidez é nefasta. A burrice a soldo, no entanto, é a pior delas. Porque o vagabundo faz passar a opinião vendida por uma convicção.

terça-feira, 4 de março de 2008

Saiba o que é a Bolsa-Eletrodoméstico

Reinaldo Azevedo

A imprensa brasileira, às vezes, é coisa bem triste. Mas também temos privilégios. Um deles é contar com Ali Kamel, colunista de O Globo e editor-executivo de jornalismo da TV Globo. Há um aspecto admirável em tudo o que faz: pesquisa. E a pesquisa se transforma em análise impecável.

A sua coluna de hoje, que publico abaixo, é uma das mais lúcidas desconstruções que já li do tal Bolsa Família. Kamel demonstra por que dinheiro público que vai para o consumo pode até gerar fortuna eleitoral, mas não gera renda coisa nenhuma. O que se tem, agora nos termos que costumo empregar aqui, é a criação de uma casta de estado-dependentes. Vale dizer: a característica mais notável de um programa como o Bolsa Família é que ele se torna dependente do… Bolsa Família. Sacaram? Não é virtude, nao. É vício.
Segue o artigo:

Bolsa-eletrodoméstico

Todos são testemunhas de que, quando o Bolsa-Família foi lançado, o objetivo era matar a fome de 54 milhões de brasileiros. Meus leitores são também testemunhas de que, desde o início, venho dizendo que não existem 54 milhões de famintos. Pois bem, uma visita à página do Ministério do Desenvolvimento Social (aqui) vai surpreender. Ali, o governo anuncia que vários estudos comprovam que o Bolsa-Família tem ajudado os beneficiários a comprar eletrodomésticos. Isso mesmo, nada de arroz, feijão e carne, isso tudo que há muito já está na mesa dos pobres brasileiros, como provou a Pesquisa de Orçamento Familiar do IBGE; o que tem sido comprado é geladeira, microondas, máquina de lavar, fogão, liquidificador, forno elétrico, televisão e DVD.

Rosa Maria Marques, da PUC-SP é citada dizendo que, no passado, todo dinheiro extra era usado pelos pobres na compra de alimentos, mas que isso mudou, graças ao efeito multiplicador do Bolsa-Família: “Com o passar do tempo, as famílias ganharam segurança de que vão receber o benefício e, assim, puderam destinar parte de sua renda para a compra a prazo de eletrodomésticos.” Rosa cita outros fatores para explicar o crescimento do consumo daqueles bens, como a elevação constante do salário mínimo, a estabilidade monetária , o aumento do número de trabalhadores com carteira assinada e a ampliação do crédito consignado, mas a ênfase do press-release do ministério é a injeção de recursos do Bolsa-Família, R$ 10,9 bi previstos para este ano.

O release cita também Felícia Madeira, do Seade (São Paulo), para quem oscilações no orçamento sempre impediram que famílias pobres fizessem gastos que necessitassem de um horizonte longo, fato remediado agora pelo Bolsa-Família: “Como existe a garantia de que o dinheiro virá, a pessoa se planeja e pode abrir um crediário para comprar um eletrodoméstico ou um equipamento para trabalhar.”

O ministério dá exemplos. A catadora de lixo Rosineide dos Santos, 47 anos, de Maceió, com três filhos, recebe R$ 76 do Bolsa-Família, mas declara uma renda total de R$ 200. Com isso, pegou um empréstimo de R$ 500 no Banco do Cidadão, uma instituição que opera com micro-crédito para empreendimentos populares. O release diz que ela já tem fogão, liquidificador, cafeteira e forno elétrico, mas que, assim que saldar a dívida, pretende comprar uma televisão. Ou seja, não usa o Bolsa-Família para se alimentar nem o Banco do Cidadão para um pequeno empreendimento: usa para aumentar a conta de luz. Patrícia Belmira Henrique, de 43, manicure mineira, recebe R$112,00 do Bolsa-Família. O dinheiro, diz o release, ajuda a pagar a máquina de lavar roupa. “Estou feliz, porque é a minha primeira máquina de lavar. Antes, tinha que lavar a roupa na mão. Dava um trabalho enorme.”

O release cita ainda o economista Cícero Péricles de Carvalho, da Universidade Federal de Alagoas, para quem o Nordeste está se transformando num cenário de muitos investimentos produtivos. O release prossegue: “A explicação para esse crescimento, além da diminuição das desigualdades regionais, vem sempre da mesma origem: as transferências de renda federal crescentes e os investimentos sociais que impactam sobre a maioria da população nordestina.” O texto conclui, orgulhoso, citando o caso de Alagoas, que há 45 meses bate recordes de consumo popular, sem, porém, “ter um crescimento econômico que justifique tamanha elevação de compras”. A razão, diz o texto, é clara: os R$ 2 bi que a Previdência dá aos aposentados de lá (o dobro do que dava em 2002) e os R$ 300 milhões do Bolsa-Família distribuídos por ano a mais da metade da população do estado.

Aposentadoria e Bolsa-Família. Há futuro nisso?

O discurso oficial agora é que o dinheiro do Bolsa-Família aumentaria a demanda por bens duráveis, o que levaria à ampliação de fábricas e ao aumento de empregos. Balela. Mesmo se fosse verdade, o consumo cresceria nas áreas carentes e a produção, nas áreas já afluentes, perpetuando as desigualdades. Na realidade, o programa transfere, mas não gera renda: o consumo só aumentaria se a propensão de consumir dos beneficiários do Bolsa-Família fosse maior do que a propensão dos que pagam o imposto que torna o programa possível, o que é improvável. O contribuinte, sem o imposto, gastaria o dinheiro em alguma coisa. Assim, trata-se de uma soma de resultado zero, não havendo aumento de produção. O programa distribui renda? Sim, mas de uma maneira não sustentável: o efeito cessará assim que o programa tiver um fim. Distribuição sustentada de renda só se obtém educando o povo, para que se possa abastecer de gente qualificada uma economia crescente.

Ninguém pode ficar contrariado sabendo que pessoas pobres, na ausência de fome, estão comprando eletrodomésticos. É bom olhar a PNAD, como faz o release, e constatar que entre 2002 e 2006, nas faixas de renda mais baixas, cresceu muito o número de lares que tem esses bens. Mas é angustiante olhar os dados das provas nacionais e internacionais que medem o conhecimento de nossas crianças e constatar que tudo vai de mal a pior. Se não há fome, por que gastar R$10,9 bi com o Bolsa-Família em vez de aplicar a maior parte disso em educação? Para aumentar artificialmente a venda de eletrodomésticos em áreas carentes?

Essa política condenará as crianças de hoje a continuar, como os seus pais, a depender do Bolsa-Família para ter um microondas, enquanto um investimento maciço em educação faria delas seres independentes, produtivos, indispensáveis para chegarmos ao bom futuro.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Lula em campanha eleitoral 2 - Governo cria 650 mil bolsas

Por Lucas Ferraz, na Folha:

O governo federal criou anteontem cerca de 650 mil bolsas do Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania), o “PAC da Segurança”. Elas vão atender policiais, jovens que vivem nas ruas, mulheres que exerçam liderança em áreas violentas e reservistas. A medida provisória, que concede auxílios de R$ 100 a R$ 400, foi criticada pelo presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Marco Aurélio Mello, e pela oposição. A polêmica refere-se à lei 11.300, de 2006, que passou a vigorar em 1º de janeiro. Ela veda a distribuição gratuita de “bens, valores ou benefícios” pela administração pública em ano eleitoral, com exceção dos casos de calamidade pública, estado de emergência e “programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior”. Lula editou uma MP ampliando o Bolsa Família nos últimos dias de 2007 para evitar problemas com a legislação eleitoral. O ministro da Justiça, Tarso Genro, defendeu a expansão do Pronasci, que, diz ele, conta com propostas da oposição: “Em nenhuma hipótese fere [a lei]. Os recursos são destinados a uma contrapartida, a pessoas que desenvolvam ações comunitárias ou que freqüentem cursos de formação para policiais integrados ao programa”. José Agripino Maia (RN), líder do DEM no Senado, classificou a medida como “eleitoreira”. “É mais uma esperteza político-eleitoral do Lula. O governo diz que não tem dinheiro e aumenta as bolsas. Vamos tomar medidas, tanto do ponto de vista legal quanto político.” Marco Aurélio Mello, presidente do TSE, reprovou a ampliação: “Isso fere a lei. Não dá para ampliar programas sociais em ano eleitoral”, reclamou. Segundo ele, caberá à Justiça Eleitoral um “posicionamento, se provocada sobre o assunto”. Presidente visitará 20 Estados antes da campanha eleitoral. “Vamos colocar o pé na lama”, diz o ministro Márcio Fortes (Cidades), que organiza as visitas aos “canteiros de obras” Das viagens dadas como certas, uma será às obras de urbanização na Favela do Lixão, em Duque de Caxias (RJ), cujo prefeito é do PMDB.

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quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Publicidade oficial: iluminismo lulista buscará os pobres e ignorantes

Por João Domingos, no Estadão:

Em ano de eleições municipais, o Palácio do Planalto vai reforçar suas campanhas publicitárias dirigidas aos grotões, o que deverá beneficiar o PT e os partidos aliados na disputa pelas prefeituras e Câmaras Municipais. A Presidência da República informou que estão previstos gastos de R$ 154 milhões em campanhas destinadas a mostrar o impacto dos programas do governo federal na vida das pessoas e como esses esforços movimentam o comércio local e impulsionam cadeias produtivas. Entre as campanhas que serão mantidas e reforçadas estão o Bolsa-Família e o Luz para Todos. Além dos R$ 154 milhões destinados à publicidade oficial, o governo terá ainda R$ 20 milhões para propaganda de utilidade pública, conforme dados do orçamento da Presidência para 2008. O Palácio do Planalto informou que, apesar de ser um ano de campanha municipal, o governo federal não terá de se submeter às regras que limitam a propaganda, pois não está envolvido na disputa. Esse valor segue a média de outros anos. A preocupação do governo com a publicidade de efeito local está sintetizada na licitação - que deverá ser concluída em fevereiro - para a escolha de três agências. Como teste de classificação, os concorrentes terão de produzir um filme sobre a importância das obras de transposição do Rio São Francisco, de grande apelo eleitoral no Nordeste.
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quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Gastança populista 1 – Lula amplia gastos do Bolsa Família por meio de MP

Na Folha. Volto depois:

Para driblar restrições da legislação eleitoral, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva editou, a três dias do final de 2007, uma MP (medida provisória) para ampliar o Bolsa Família, o principal programa social do governo. Lula deu um bônus de R$ 30 reais para adolescentes de 16 e 17 anos. Antes, o benefício era concedido a famílias com crianças de até 15 anos, no limite de até três beneficiadas. A proposta de ampliação do Bolsa Família foi enviada ao Congresso em outubro por meio de projeto de lei. Mas sua tramitação ficou parada porque a Câmara dos Deputados teve a pauta paralisada por outras MPs e pela ordem política do governo de priorizar negociações com a oposição no Senado para tentar aprovar a CPMF até 2011. Como a Câmara não apreciou o projeto, Lula resolveu concretizá-lo via MP ainda em 2007 para evitar questionamentos judiciais com base na legislação eleitoral. Como haverá eleições municipais neste ano, há restrições para gastos do governo. A lei nº 11.300, criada em 2006, proíbe durante todo ano eleitoral a distribuição gratuita de “bens, valores ou benefícios” por parte da administração pública, com exceção dos casos de calamidade pública, estado de emergência ou “programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior”.

Reinaldo Azevedo
Isto é Lula. Tudo feito no escurinho do cinema. E o resto que se dane. Em vez de ampliar o esmolário nacional, ele deveria se empenhar é em ir desmontando o circo. Mas quê… O homem precisa financiar o projeto eleitoral do partido. Em vez de aumentar impostos (ler nesta página) para compensar a perda da CPMF, deveria é cortar despesas. Mas ele as eleva. Taí. Fica, assim, evidenciando que as oposições fizeram mal ao aprovar até mesmo a DRU. Enquanto Lula se fingia de manso com a mão direita, enfiava a esquerda no erário.

Gastança populista 2 – Oposição e ministro do STF apontam ação no “apagar das luzes”

Na Folha:
Líderes da oposição e o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Marco Aurélio Mello, questionam a legalidade da medida provisória que estende os benefícios do Bolsa Família para jovens de 16 e 17 anos. Mello acredita que mesmo que a MP tenha sido editada ainda em 2007, ela poderá ser considerada pelo tribunal uma fraude à Constituição por ter sido feita, diz ele, “no apagar das luzes”. A medida foi publicada no último sábado, em edição extra do Diário Oficial, entre o Natal e o Réveillon. “Não posso antecipar o juízo do colegiado, mas [a MP] corre o risco de ter problemas”, disse. Já oposicionistas prometem questionar o Supremo Tribunal Federal sobre a legalidade da MP por acreditarem que a atitude foi uma forma de o governo burlar a lei nº 11.300, que proíbe a gestão pública de criar e ampliar programas sociais e de distribuir benefícios em ano eleitoral. Outra reclamação é que a extensão do programa já estava prevista em projeto parado no Congresso, o que demonstraria que a medida não tem urgência.
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